domingo, 12 de fevereiro de 2017

EM: O reverso da Medalha... (um texto a quatro mãos)

Minha vida sempre foi atribulada: adolescente questionadora, uma escolha profissional que infelizmente, neste país, me trouxe até agora poucas opções de satisfação profissional e conforto material, um relacionamento pessoal do qual surgiu meu tesouro Lucas, mas que depois de consumir minha autoestima e amor próprios por muitos e muitos anos, agora acabou... e como condição de contorno, a EM, e tudo que ela representa na minha vida!

Recentemente, conheci uma pessoa que hoje é meu namorado, que mesmo antes do  primeiro beijo já sabia da EM e nunca pareceu se importar com isso.  Não foram poucas as vezes em que tentei afastá-lo com frases do tipo "tá preparado para empurrar minha cadeira de rodas?" ou "você nunca vai saber como me sinto, então não me julgue".  Óbvio que brigas acontecem, algumas desagradáveis, mas estamos juntos por um sentimento que ainda não tem muitas palavras e explicações associadas...

Uma das coisas que ele me fala é que eu coloco a EM no centro da minha vida.  Que eu monto minha vida no "dado que eu tenho EM...", enquanto eu devia pensar "apesar de eu ter EM...".  Toda medalha tem dois lados, mas sempre tem aquele mais bonito, que chama mais atenção, e que escolhemos colocar como o lado visível para quem quiser observar... inclusive nós mesmos...

E nesse pouco, porém intenso tempo em que estamos juntos, vejam só, já tenho vários apelidos! Ele me chama de "maluquinha predileta".  Eu nunca me importei, porque me acho meio maluquinha mesmo... "Maluco" é uma palavra preconceituosa, mas na verdade ela, para nós esclerosados, nada mais deveria significar que assumimos riscos em nossas vidas que podem ser anti-naturais, mas que dada a fragilidade da existência humana, podem nos aproximar da vida que vale a pena ser vivida.  Não há problemas em "esticar a corda" desde que possamos responder por nossos atos.

Também, meu nível de estresse no dia a dia e meu hábito de pensar pouco antes de falar me renderam outro apelido: "Lili Alfinete".  Na verdade, é impressionante como podemos fazer a vida sorrir para nós de volta se sorrirmos para ela.  Palavra dita não volta pra boca e banalizar o uso da palavra desculpa não ajuda em nada.

A EM nos apavora pela sua capacidade de nos tirar do prumo, pois até a unha encravada pode ser vista como alguma coisa supostamente grave que começou a dar errado no nosso organismo.  Mas, se temos passe livre em diversas coisas práticas da nossa vida (bem, eu não pago ônibus), essa mesma liberdade deve ser usada para a felicidade de quem amamos e não para que "tenhamos o direito" de falar e fazer o que quisermos...

Por fim, a tal da ansiedade, a doença que tanto incapacita o ser humano, que na EM é potencializada pela ainda maior imprevisibilidade do comportamento do nosso organismo. Infelizmente, por uma dessas coincidências da vida, controlar a ansiedade com remédios, para mim, não é uma opção... (só um dos meus rins funciona bem) então eu choro, Choro, CHORO! Tenho raiva, tenho medo, e talvez dê menos valor às pequenas alegrias do que deveria, pois os "monstros adormecidos" da dor e da incapacitação podem acordar a qualquer momento e, por isso, devoto a essa "gestão do medo" muita energia, que acaba faltando para outras coisas.  Ou, como diz meu namorado, sou que nem o esquilinho do filme "Deu a louca na chapeuzinho", que de tão ansiosa e, às vezes, confusa, querendo estar sempre a frente do meu (escasso) tempo, somente me sinto compreendida por quem me ama (no caso do filme, pasmem: é o Lobo Mau...).

Finalmente, estou na fase de transição da minha vida pessoal, na qual toda a rotina está sendo bastante modificada e para a EM, muitas vezes, mudanças significam "ah não, algo mais pifando no meu organismo".

Não precisa ser assim... Hoje alguém tenta me mostrar que temos nossa vida por empréstimo Divino e que a única forma de ter sucesso nessa empreitada é tendo o controle dela, apesar de...

Pois é! APESAR DE parecer, não fui eu que escrevi essas palavras e apesar dele não ter me pedido para dar-lhe créditos (dizendo que o texto era meu, dado que eu era/sou a musa), foi meu namorado quem escreveu esses parágrafos com um nível de sensibilidade quase assustador (se eu fosse normal, acho que teria saído correndo).

Fui, então, obrigada a aceitar que algumas pessoas especiais têm muita capacidade de entender como nós esclerosados nos sentimos, ainda que não sintam também. E nesse ponto vale pensar que se por um lado elas não podem sentir por nós, por outro, podem nos AJUDAR a carregar as "malas pesadas e sem rodinhas"!

O que venho percebendo, a duras penas (e graças à paciência e resiliência quase infinitas dele), em meio as já mencionadas brigas, é que não posso querer um "carregador automático de malas", ou uma "muleta que ande por mim"! Isso jamais daria certo (como não deu nos últimos 10 anos e muito por culpa minha). Ninguém, por mais que me ame, será capaz de viver minha vida plenamente e melhor do que eu mesma. JUSTAMENTE PORQUE ELA É MINHA! E temos obrigação moral de sermos a melhor versão de nós mesmos porque a vida é muito curta para se apequenar e pelo simples fato de que: somente NÓS podemos fazê-lo!

Em relação à mudança de rotina, preciso dizer que foi quase como a "bomba de Hiroshima"! Esse ano troquei meu filho de escola, o tirei do integral, me separei recentemente, tive brigas exorbitantes com minha família, "pequenas" questões no trabalho (como estar com salários atrasados e parcelados que nem casas Bahia, rsrs) etc! E a vida dele também não anda nada fácil!

E, nesse ponto, vale destacar o fato de que ainda que haja um ANJO (porque posso ser "esquilinho", mas ele JAMAIS será "lobo mau") me apoiando e sendo a grande força impulsionadora que me tirou da inércia, a continuidade do movimento e novos passos vêm sendo dados por mim mesma e, por vezes, SOZINHA! Hoje, mãe solteira (namorando), esclerosada e vivendo um dia de cada vez!

Tentando olhar o queijo EM vez dos buracos, o copo meio cheio, o mundo colorido! Tentando boiar calmamente, EM vez de me afogar! Tentando viver, APESAR DE TUDO, com a certeza e a fé (aquela fé que é só minha e poucos entendem) de que a vida dará certo, desde que eu siga SEMPRE motivada no meu caminho (com foco no prêmio), dando um passo de cada vez, pois direção e sentido importam muito mais do que velocidade!

"Porque metade de mim é amor, e a outra metade também!" (Oswaldo Montenegro), as duas metades são dele e viver "ao seu lado" (no melhor estilo Eduardo e Mônica) é uma dádiva tão grande que já julguei não merecer! Algo como um encontro de almas, que mesmo que não seja pra SEMPRE (pois sempre é muito tempo), terá sido eterno enquanto "durar"!

E fica a pergunta: se eu posso, por que não cada um dos que estão lendo? "YES, WE CAN!"

Porque não se trata apenas da forma como os outros nos veem, mas da forma que nos enxergamos! Não se trata apenas de namoros, mas de todas as relações! Se trata, sobretudo, de retomarmos as rédeas das nossas vidas, muitas vezes perdidas para a EM (ou até para outras coisas mais bobas...).

ANJO, DESCULPA, MAS EU TE AMO E MUITO... (aposto que só você irá entender!). Porque você é o melhor reverso da medalha do meu coração!

Liane Moreira
Bióloga

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

TEXTO DE ANO NOVO 2015/2016 - REVISITADO POR MIM...

“Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança,
fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar
e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação
e tudo começa outra vez, com outro número
e outra vontade de acreditar
que daqui para diante tudo vai ser diferente.”
(Autor desconhecido)

Vêm chegando o Natal e o fim de Ano! Para alguns tempo de beber e comer, para outros, tempo de orar/rezar e agradecer a Jesus e para tantos, tempo de sonhar com o Papai Noel e seus presentes!

Para mim, apenas: Tempo de refletir... E para aqueles que gostam de escrever, nada melhor e mais fÁcil para pensar do que revisitar um texto! Escolhi um que escrevi em Dezembro de 2015, publicado em meu blog pessoal, mas não na ABCEM. Naquela ocasião, disse para mim mesmA que 2016 seria o primeiro ano da Minha mudança...

“2016, meu ano de mudança! Não aquela mudança por fora da roupa nova ou da super maquiagem de ano novo! Mudança interna! Resgate de valores!"

Passamos o ano novo no interior de MG! Um dos anos novos com menos gente, com a ceia menos farta, com poucas expectativas! Afinal, o dia seguinte seria apenas o dia seguinte, ainda esclerosada e  em surto! Em outros anos da minha vida, certamente, julgaria como um réveillon triste. Mas, não foi isso!

Foi o ano mais farto de pensamentos positivos! Um ano sem maquiagem, sem roupa nova! Um ano com roupa colorida! Aliás, nunca vi tanta gente substituindo os clássicos branco (paz) e vermelho (amor) pelo dourado e amarelo “ostentação”, seguindo a ideia de espantar a crise econômica do país. Espero do fundo do meu coração (iludido) que todas essas pessoas queiram mais luz, mais energia, mais sol e renovação, não apenas dinheiro!

Um ano sem sapatos novos! Aliás, sem sapato algum. De pés no chão, na grama do quintal, acalmando os cães devido aos fogos de artifício! Um ano com Natal e Ano Novo com meu marido desembarcado e ainda viajando juntos (o que é raro!). Percebendo que quanto menos tento exigir da vida e programá-la milimetricamente, mais coisas recebo dela. Mais nuances sou capaz de perceber, mais paciência aprendo a ter. E, dando mais espaço ao acaso, melhor passo a me conhecer.

Um ano em que ouvi meu pequeno Lucas dizer: "Quero ver fogos. Não tenho medo, mamãe!" Ele já não é mais tão pequeno assim. Está crescendo e eu, dia a dia, com todas as dificuldades da esclerose, vou cumprindo minha missão. Não sou nem de longe a melhor mãe do mundo. Mas tento ser sempre a melhor que posso, mesmo abarrotada de defeitos.

Um ano da ceia (venerada pelos gatos) feita inteirinha pelo “mestre-cuca”, Rodrigo! Em que passamos a tarde já degustando cervejas e deliciosos bolinhos de bacalhau. Porque afinal, estar junto já é bom e divertido. Não precisamos esperar o momento oficial da ceia para celebrarmos em família. Sempre é hora de celebrar, mesmo sem todas as pompas e circunstâncias! Estas que, às vezes, nos desviam do verdadeiro foco do natal, do ano novo, da VIDA!

Um ano em que dormimos cedo, logo após estourar a champanhe da meia-noite. Champanhe que eu bebi no copo de requeijão e no gargalo da garrafa! Estou vivendo a vida cada vez mais preocupada com as essências do que com as aparências! Foi um Réveillon com uma bela e longa noite de sono. Não por tristeza, mas por entender que meu corpo está nesse ano precisando de verdadeiro descanso. Está precisando recarregar baterias e energias, e quanto antes isso ocorrer, antes, poderei voltar o melhor possível ao batente, às lutas diárias da minha vida esclerosada.

Além disso, aprendi a apreciar a manhã seguinte! De que vale apenas uma noitada isolada? Sei que MG não tem praia, mas, ainda precisávamos dar o primeiro mergulho do ano, favorecendo minha nova empreitada anti-esclerose, qual seja, dar um upgrade na minha vitamina D! E o sol...Ah o sol! Ele é ótimo para isso!

Fonte: acervo pessoal


Em 2016...eu quero caminhar...
com simplicidade...
buscando a serenidade...
por entre as dificuldades...
sobre as diferenças...
Caminhar SEMPRE
em FAMÍLIA!”


Em 2017, eu ainda quero a mesma coisa! Repetindo o que foi bom, e seguindo em frente, segundo após segundo, com a minha companheira EM. Modificando gradualmente o que não foi satisfatório, pois afinal, como afirmou  John F. Kennedy: "A mudança é a lei da vida. Quem só olha para o passado ou para o presente, perderá o futuro". E, sobretudo, tendo a sabedoria para identificar esses dois tipos de situação.

Venha 2017... com “Mais amor, por favor”!

TEXTO DE 2015, REVISITADO E PUBLICADO NO BLOG DA ABCEM

"A irracionalidade de uma coisa não é argumento contra a sua existência, mas sim uma condição para ela."

(Nietzche)

Essa frase, que achei por acaso ao procurar outra, reflete exatamente o que estou vivendo neste momento.

Há 9 anos convivo com a esclerose múltipla e em meados de 2015  ela resolveu acordar com força total. Estava naquele momento com três lesões novas no meu cérebro e com outras duas placas antigas em atividade. A questão é que sempre levei tudo na brincadeira, não por ser forte como muitos pensam, mas, por ser fraca demais e incapaz de encarar a doença. Foi por isso que sempre a NEGUEI!

Fato é que sem sentir muito bem as pernas e estando extremamente tonta, percebi que a esclerose resolvera acordar e que a luta havia começado! Podia ser que a cortisona resolvesse o surto e eu ficasse bem de novo, mas, até quando? E podia ser que também não resolvesse! O ponto é que eu precisava, mais do que ninguém, entender e aceitar o caráter finito de toda e qualquer vida. JAMAIS compreendi e acho que por isso fico sempre desesperada de pensar em como todos os que gostam de mim viverão sem a minha presença e ou, lidarão com uma possível futura invalidez. Na verdade, já me sinto um pouco inválida por não conseguir fazer tudo o que fazia. Por não conseguir não ficar tonta! Por sentir um cansaço atroz e uma preguiça que advém da fadiga e da depressão!

Não serei hipócrita de dizer que fiz tudo o que queria na vida. Na verdade, sempre falta algo e essa é a  graça da existência que conscientemente enxergo, mas que não consigo aceitar intrinsecamente.

Queria ter outro filho, ter mais dinheiro para sustentá-lo e queria viajar mais por aí (vencendo o medo de avião). De resto, eu não QUERO mais NADA! Mas, infelizmente, todas essas coisas naquele momento já não eram possíveis ou, ao menos, não prudentes.

Então, lidando com o que era plausível: o que queria era que a cortisona fizesse efeito, mas, se por acaso não fizesse, eu gostaria apenas que todos se lembrassem da Liane que conheceram até 2013. Quando comecei a me sentir muito tonta e aos poucos fui piorando Não queria a pena de ninguém, sobretudo se eu não morresse, mas, entortasse! Pessoas "tortas ou abobadas" ainda são pessoas e merecem dignidade. ISSO PARECE ÓBVIO, eu sei! Mas na prática não é fácil! Eu, hoje, esclerosada há 9 anos, estou aprendendo ainda a lidar com meus colegas esclerosados e cadeirantes do Hospital do Fundão e eu digo NÃO É FÁCIL! QUE VERGONHA DE MIM, POR ISSO!

Pode ser que demore pra isso acontecer ou que NUNCA aconteça. Mas a morte é certa pra todos e peço a vocês que reajam da mesma forma. Que reajam naturalmente, pois a morte deve ser natural. Ela é a única certeza da vida!

Não quero interjeições do tipo: "Ela era TÃO jovem!" "ela lutou tanto e não adiantou!" "Que tristeza!" "Coitado do filho dela!" E tampouco quero meus amigos e minha família tristes. Pelo contrário, quero uma bela  festa com um bom samba e quero que cuidem/acompanhem o Lucas sempre com felicidade porque  ele é muito alegre e merece seguir assim!

Naquela época comecei a escrever porque a  doença me faz refletir. Na verdade,  a doença me dá  algo que muitos de  nós não valorizamos: a esclerose e a possibilidade de ficar ruim a  qualquer momento me dá a chance e a garra pra aproveitar cada segundo, mesmo que passando mal (tonta, com dor, sem sentir os braços e pernas) como se fosse o único,  o último bom e são! Eu não gostava de fotos. Agora, as amo! Elas  ficam pra posteridade. Elas captam a  essência dos momentos! A esclerose, sobretudo, me dá múltiplas possibilidades de agradecer, de me despedir e de dizer te amo a todos que desejo e, da mesma forma, de receber isso das pessoas que gostam de mim! Minha avó morreu há 3 anos e fico triste de não ter ido vê-la. Ali comecei a entender verdadeiramente o que está culminando nesse texto! Que tudo passa, a gente também passa! A questão não tem que ser a morte e sim a força e a vontade com que se vive!

Em 2015, parei e chorei 5 horas sozinha dentro do quarto e parece que consegui progredir mais do que em anos de EM e terapia. Acho que finalmente entendi que  existem coisas que não são controláveis e que morrer ou entortar não é derrota alguma e, sim, fatalidade! SE E QUANDO ISSO OCORRER, A CULPA NÃO VAI SER MINHA! Eu não vou ter perdido a guerra, mas sim, ganhado anos de batalhas.

Uma vez... o chefe do meu chefe (grande homem) me disse: "você pode até morrer da doença, mas não pode deixar ela te vencer!" E é por isso, que tonta ou não, triste ou não, sozinha ou não, vou viver até o FIM! É assim que quero que as pessoas me vejam! Sem pena! E que saibam que eu não guardo rancor e ressentimento de NINGUÉM! Assim eu me despeço e vou curtir a noite, porque a vida segue e o tempo não pára!

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Vamos Pilatear?

Muitos de nós já sabem o que significa Pilates e para os que não conhecem, é simples, basta digitar a palavra no Google e infinitas referências irão aparecer. 

O que muitos talvez não saibam é: de onde vem essa febre mundial chamada Pilates? 

A técnica Pilates teve origem na própria história de vida do Joseph Hubertus Pilates, um alemão que teve interesse muito cedo por atividades físicas devido  ter sofrido com algumas doenças como: asma, raquitismo e febre reumática. Mas, foi num campo de concentração em Lancaster-1914, que a técnica começou a dar seus primeiros passos, quando Joseph foi considerado "inimigo estrangeiro" pelas autoridades britânicas, foi exilado e aproveitou para fazer suas primeiras experiências em corpos alheios ao seu. Utilizava as molas dos colchões para trabalhar resistência muscular (daí vem à origem das molas dos aparelhos de pilates). O que se seguiu foi o aparecimento de resultados incríveis: nenhum dos internos que fizeram parte do seu treinamento se contagiou com a epidemia de influenza que matou milhares de outros colegas internos naquela época. Mais tarde Joseph foi para Nova Iorque e aprimorou a técnica que hoje chamamos de Pilates, trabalhando a reabilitação e condicionamento físico dos bailarinos do New York City Ballet de maneira inovadora e eficaz. A partir daí ele desenvolveu os primeiros aparelhos e a fundamentação dessa técnica que hoje alcançam o mundo todo.

Mas, o que Pilates tem a ver com EM? No meu caso particular, o mEU Pilates tem sido a salvação para MINHA EM! O primeiro motivo consiste no fato do Pilates ser tão mutável e surpreendente quanto a doença! É possível adaptar cada um dos exercícios para cada pessoa! Me lembro bem que ao chegar em março na neurologista e ser encaminhada para fisioterapia/Pilates, me senti estranha e relutante. Por um lado, eu não queria aceitar que necessitava de fisioterapia e, por outro, não acreditava que seria capaz de fazer Pilates, saindo de um surto brabo de EM. Afinal, um ano antes, com a doença estável, eu já havia tentado praticar por 3 meses e apesar de adorar, achava aquilo tudo difícil demais. Vale destacar que no primeiro estúdio que fiz Pilates havia uma senhora com apenas uma das pernas que se exercitava tanto quanto qualquer um dos demais alunos.

Fonte: Acervo pessoal
O segundo motivo que merece destaque é a própria origem da atividade, pois se Joseph ao ter medo de ir parar em uma cadeira de rodas pôde criar esse método maravilhoso de controle corporal, ainda no século XX, o que nós com EM não podemos fazer,com toda a tecnologia e medicina a nosso favor? Joseph morreu com mais de 80 anos, tentando salvar parte da obra de sua vida sem nunca ter usado a tão temida cadeira.

O terceiro aspecto consiste no fato do Pilates trabalhar muito mais do que o corpo. O foco está na interface entre corpo e mente. A respiração, a postura, o desafio, o controle, a paciência e até a criatividade que a atividade exige fazem com que o equilíbrio seja possível entre corpo e mente.

O quarto aspecto central é que o Pilates nunca fica obsoleto e enjoativo. Basta escolher um professor criativo que saiba lidar com as suas condições específicas e que veja nelas, muito além de obstáculos, terrenos férteis para dar asas à imaginação.

O quinto ponto e o que para mim é esplêndido, é que você pode praticar muitos dos exercícios do Pilates na sua cama! Logicamente, para iniciar qualquer atividade física, orientação profissional é necessária. Mas, aos poucos, você pode praticar diariamente em casa! Sem auxílio de aparelhos, e de graça! Podendo assim, dar continuidade a tudo que aprende no estúdio.

Fonte: Acervo pessoal

Por fim, destaco a rotina exigida pelo Pilates e por muitos outros exercícios, o que para nós com EM, é essencial! Hoje, após quase 7 meses praticando, indico a cada um de vocês leitores, especialmente, os esclerosados, que tentem "Pilatear". Destaco a importância de procurar um profissional capacitado e sério (pois exercício não é brincadeira) e um estúdio em que se sintam respeitados, estimulados e acolhidos.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Tonturas MÚLTIPLAS!

O mês era outubro e o ano 2013... O dia havia sido normal e a noite estava quente, mas bonita. Chegando do trabalho na casa da minha mãe, precisei me sentar no chão, antes que eu caísse. De certo, não me lembro de todas as vezes que senti a mesma coisa dali até hoje, mas, JAMAIS me esquecerei daquele momento inicial de TONTURA!

Nem cheguei a dar boa noite para minha mãe, pai e filho, e saí correndo para o Quinta Dor, onde minha irmã foi me encontrar, e me acompanhar. Fui encaminhada ao neurologista de plantão assim que descrevi os sintomas e me auto declarei paciente de Esclerose Múltipla e ele, seguindo todo o protocolo, fez aqueles testes de reflexo, no consultório, que todos esclerosados já estão bastante acostumados. Como eu havia acabado de iniciar o tratamento com Fingolimode cerca de 2 meses antes, o médico indicou que eu entrasse em contato com a minha neurologista, visto que os exames de rotina (sangue, eletrocardiograma etc) realizados na emergência estavam normais. Vale dizer que esse remédio para EM ainda estava em teste, no Brasil, de modo que eu estava me sentindo um verdadeiro rato de laboratório. Liguei, então, para a minha médica que estava na Dinamarca, mas me pediu que suspendesse o medicamento IMEDIATAMENTE e procurasse um colega dela, especialista em arritmia cardíaca. Assim que ela retornou ao Brasil, eu ainda tonta, fui a uma consulta em que após exames e perguntas, concluiu-se que a minha tontura não era cardíaca e sim vestibular, o que para a médica foi um alívio, dado que me possibilitou voltar com a medicação para a esclerose, que além de tudo, fazia parte do programa de pesquisa de liberação da droga, exigido pelo SUS.

Fonte: Google imagens
Meses se passaram em que alternei entre momentos de tonta, muito tonta, extremamente tonta e “acho que to morrendo”. O bom humor lentamente ia dando lugar ao desespero. Afinal, a tontura não vinha sozinha! Ela trazia consigo o super enjoo, a esporádica dor de cabeça, a eterna ansiedade, e o medo/insegurança constante! Sete meses depois, tive um desses momentos de sensação de morte iminente e, novamente, fui parar no Quinta dor. Por acaso ou sorte do destino, fui atendida pelo mesmo neurologista que se lembrou de mim. Esse é outro daqueles momentos de vertigem que JAMAIS vou esquecer, não pela sensação insuportável apenas, mas pela competência e humanidade daquele jovem médico, que chegou inclusive a me empurrar na cadeira de rodas pelos corredores do hospital. O doutor Vinicius trabalha com esclerose no hospital Universitário Pedro Ernesto (UERJ) e me vendo naquele estado, quase um ano depois, me pediu uma ressonância magnética na emergência (coisa bem rara), bem como, realizou testes vestibulares que me deixaram “tipo uma geleca” de tantas náuseas.

Depois desse dia, fui encaminhada para um otorrinolaringologista, já que a minha ressonância não mostrava nenhuma alteração aparente que indicasse novas lesões e atividades da EM. Fiz testes para labirintite que deram todos positivos e por cerca de 2 anos tomei alguns remédios para tratá-la. Mas, e daí a sua tontura passou, né? Na verdade, NÃO! Ela seguiu e ainda segue um pouco mais amena (mas, bemmmm pouquinho).

No final de 2015, então, já sem ter a menor ideia do que fazer (afinal, a labirintite te deixa tonta até deitado), consegui finalmente uma indicação de fisioterapia vestibular com o fisioterapeuta André Luis, especialista com mais de 20 anos de experiência nessa área. Logo na primeira consulta houve a desconfiança que toda essa TONTURA, advinha, era da esclerose (contrariando dois neurologistas super experientes, que há 2 anos me garantiam que eram coisas totalmente independentes). Para ele, era decorrência de uma lesão medular no “braço direito da ponte”, ou seja, uma lesão desmielinizante na medula, nas proximidades da entrada do nervo vestibular (nervo do ouvido). Resumindo: Meu ouvido estava bom, o que não estava, era o controle que meu cérebro exercia sobre ele.

Mas, então, o que fazer? Segundo orientações do fisioterapeuta, a melhor saída seria fazer exercícios que fortalecessem meu labirinto de modo que ele pudesse auxiliar meu cérebro e, assim, segui com a fisioterapia por cerca de 2 meses, tomando remédios para enjoos, visto que a fisioterapia forçava meu ouvido/cérebro até a exaustão. De fato, os exercícios me auxiliaram um pouco. Mas, o melhor de tudo, foi acabar com a angústia de não saber qual era o motivo da tontura e o que poderia ser feito para melhorar. Os exercícios fisioterapêuticos foram a minha luz no fim do túnel.

Nesse ponto chamo a atenção para o fato de que o sintoma se expressou, mesmo sem que houvesse detecção de novas lesões nos exames de imagem. Ou seja, possivelmente, as técnicas atuais de exames não foram suficientes para entender o que estava acontecendo no meu cérebro, que mesmo com lesões aparentemente inativas, geravam exacerbações de novos sintomas. Justamente por isso, não culpo os médicos que não foram categóricos em afirmar que a minha tontura era inerente da esclerose. Além disso, lembro-lhes da importância de sempre associar os exames de imagem com os quadros clínicos que apresentamos, buscando sempre uma melhoria e/ou estabilidade para nossa qualidade de vida com/apesar EM.

Em Novembro de 2015, ainda durante a fisioterapia, veio uma bomba: um novo surto de EM, que deixou as minhas pernas instáveis, além de ter me trazido uma nova companheira: uma dor neuropática em forma de queimação que NÃO ME LARGA! Além do desespero inicial de ter surtado após 8 anos sem ABSOLUTAMENTE NENHUMA ATIVIDADE da esclerose, seria necessário fazer pulsoterapia (metilprednisolona IV – corticoide venoso) e sentir NOVAMENTE o gosto amargo da Esclerose Múltipla. Nesse momento, ao tratar o surto com a “pulso”, notei que a minha arqui-inimiga TONTURA aos poucos foi ficando em segundo plano, corroborando a ideia de que de fato, ela teria relação com a EM.

Agora em maio de 2016, ainda sinto tonturas, quase que o tempo todo, mas num nível extremamente mais leve do que antes. Piora bastante quando balanço a cabeça rápido, quando fixo o olhar muito tempo em monitores e prefiro nem comentar o que acontece quando sinto emoções fortes. De fato, aquela, a primeira tontura de 2013, veio assim que minha avó faleceu e no momento que defendi meu mestrado, que se arrastava por três longos anos em um processo hiper desgastante. Mas, além da intensidade da tontura,outra coisa mudou: o nível “acho que vou morrer”, foi substituído por: “sei que está muito ruim, mas logo passa”.

O surgimento desse novo nível de compreensão do meu sintoma me fez voltar a ter esperança, vontades e sonhos na vida.

Não é fácil e sei que a tendência é piorar, pois a doença é progressiva, especialmente a médio e longo prazos. Mas, já não penso mais em desistir! Já não me imagino ou sonho em tirar meu cérebro e deixá-lo no criado-mudo enquanto saio para viver a vida! Digo a todos vocês, que até hoje a tontura foi o pior sintoma que senti, sendo a única que me fez sentir-me menos capaz. Isso porque, a tontura tirou, por vezes, a capacidade de pensar e me concentrar, algo que para mim é EXTREMAMENTE caro. Cheguei a esquecer por 30 minutos a senha do cartão de débito que usava todos os dias. Quem me conhece, e a minha memória, sabe o quanto isso é SURREAL DESESPERADOR.

Mas, Liane, nesse tempo você parou? NÃOOOOOO! Foi ABSURDAMENTE DIFÍCIL, mas terminei meu primeiro mestrado em 2013. Cursei meu segundo mestrado em sua totalidade, até defendê-lo em 2015. Segui trabalhando no INEA, (de 2013 a 2015 como gerente substituta) sem pedir licença-médica (de 2015 para cá com certa compreensão dos chefes). Fiz Pilates por cerca de quatro meses em 2015 e estou recomeçando essa semana. Fiz festas para o meu filho em todos os outubros de lá para cá (com ajuda da família, É LÓGICO). Viajei um pouco pelo Brasil e também fui à Argentina. Criei meu blog pessoal e entrei para a ABCEM. Por algumas vezes, fui ao hospital acompanhar pai, mãe e irmã, porque meu sofrimento não exclui o de outrem. Pintei muitos desenhos como hobby (estão todos no meu blog pessoal).

Mas, nem tudo são vitórias e de fato, foi doloroso ver meus amigos e colegas de trabalho se afastando, afinal, sendo mãe e reclamando efusivamente e quase sempre de não estar 100% (por muitas vezes, acompanhado de longos choros), não sou assim uma companhia tão atrativa. As pessoas, em geral, não estão preparadas para ouvir e auxiliar na dor alheia. Elas não estão preparadas nem para a própria dor! Mas, eu entendo: Há momentos em que nem eu me aguento! Além disso, minhas idas ao hospital foram semanais ao longo de 2015 (às vezes, até 2 vezes na mesma semana). Cheguei a assistir ao show do “System of a Down” do Rock in Rio, diretamente do Quinta Dor, tomando medicamento na veia ao lado do médico e das enfermeiras. Outra frustração enorme era saber que meus gastos com especialistas e remédios eram enormes e que meu salário já não era suficiente para me bancar. Agora imaginem como me senti tendo que contar com minha irmã (que me ajuda MUITO, financeiramente, até hoje), sendo leonina, feminista, orgulhosa, dentre outros... TUDO ISSO É BEM DURO!


Por fim, os conselhos que posso dar para quem se sente como eu, são: Evite estar sozinho (hoje tenho uma secretária que dorme na minha casa), pois a tontura não mata, mas a queda, NUNCA SE SABE! Além disso, se tonto ficar, sente-se, se acalme, respire, quase como se fosse um mantra, pois ansiedade PIORA EM MUITO AS COISAS! Se não melhorar, deite! Se ainda assim não passar, procure um médico. Mas... Dizem por aí, que aprendemos pela dor e pelo amor e, deveras, esse sintoma me ensinou a dar valor ao bem que temos de mais precioso: a VIDA. VIVAM E SORRIAM, SEMPRE, APROVEITANDO CADA MOMENTO COMO SE FOSSE O ÚLTIMO BOM E SÃO!

Sejamos mais selvagens: sEM medo de ser feliz!

“Só sei
Que o corpo estremece,
As pernas desobedecem.
Inconscientemente a gente dança,
As mãozinhas então embalançam.
Quando passa eu vou atrás...”

O tema do texto de hoje me atropelou como um trator no meio da tarde de ontem, porque na verdade, outros diversos assuntos estavam pairando na minha cabeça para integrar o blog nessa quinta-feira. Pois bem, vamos lá...

No meio da tarde do dia 01/06/2016, as minhas pernas, que andam ruins desde o meio de 2015, resolveram dar sinal de vida, OU MELHOR, NO MEU CASO, SINAL DE AUSÊNCIA! Às vezes, queimam, ora, pesam, por momentos, gelam, quiçá, ficam leves, raramente DOEM ou, SIMPLESMENTE, SOMEM! Meu objetivo aqui, não é definir categorias como: isso é dormência, aquilo é paralisia, outra coisa é paresia (deixo isso para os nossos blogueiros médicos, pois eles sabem muito melhor o significado de cada uma dessas palavras)! Pelo contrário, o foco é mostrar como me sinto (COM MINHAS PERNAS ESTRANHAS E DESOBEDIENTES) e como tento lidar com isso a cada segundo, porque A ESCOLA DA VIDA TAMBÉM ENSINA E A ESCLEROSE MÚLTIPLA É UMA EXCELENTE PROFESSORA PARA QUEM SE ABRE AO APRENDIZADO!

Dizem que o primeiro passo é um dos mais importantes, então, como lidar com o medo de cair ao tentar caminhar? Ninguém que não seja um neném, um idoso debilitado ou um paciente, como nós, É CAPAZ DE ENTENDER! Mas, às vezes, um olhar de fora pode nos auxiliar! Minha irmã Paula sempre diz: VAI! E SE DER MEDO, VAI COM MEDO MESMO! Pode parecer cruel e sem empatia, mas, vindo dela, entendo como algo prático e pragmático, porque afinal, que opções eu tenho? 1) Chorar sem parar, enquanto fico parada em casa; 2) Rezar, chorando sem parar, enquanto fico parada em casa ou 3) SEGUIR EM FRENTE, ANDANDO COM A MINHA FÉ (que poucos entendem) DO MEU “JEITINHO” E CHORANDO MUITAS VEZES, MAS EM MOVIMENTO!

Pensem comigo, amigos esclerosados: se não tentarmos andar por medo de cair, nem ao menos saberemos se iremos ou não sofrer a queda. É preciso tentar, dando ao nosso sistema nervoso problemático, o benefício da dúvida. Se acontecer a queda, levanta-se a cabeça, ergue-se a coluna, respira-se para encher o coração de paz, aguarda-se por ajuda, e numa próxima vez, usufruí-se de apoios diversos!! Até hoje NUNCA usei apoio, mas não me negarei a usá-los quando/se a primeira queda ocorrer e a necessidade for óbvia! E sabem por que? Porque isso é parte da aceitação da doença, de fato! Se eu me mantenho em casa com medo, deixo de ser eu mesma, em vez de tentar ser a melhor versão do meu novo eu, AINDA QUE “SEM PERNAS”!

Na última sexta-feira, por coincidência do destino (ou não), nosso passarinho sofreu um acidente doméstico e perdeu a perna direita INTEIRA! Logicamente, sentiu dor e ficou acanhado por alguns dias, até que agora, APENAS 1 SEMANA DEPOIS, JÁ SE PENDURA (PERNETA) NO PULEIRO COM MAESTRIA e nem quer saber de deixar esse mundo!! Ahhh, Liane, mas como bióloga, você deveria saber que os seres vivos são diferentes! De fato, há fundamento nisso! A irracionalidade dos demais seres confere a eles certa ausência de MEDO DA MORTE! O passarinho seguirá a vida, por instinto, com o mesmo ÍMPETO, ainda que com desafios, com ou sem perna, assim como cães amputados, até que o corpo pare de funcionar! MAS NENHUM DELES, NUNCA DEIXARÁ DE VIVER POR MEDO!

Nesse ponto, chamo a atenção para mais um toque providencial da minha irmã! Viajamos em março (em pleno surto) e eu não sentia quase nada em toda a extensão dos DOIS pés até a bunda, mas ainda tinha movimento, alguma coordenação e força!Numa das noites da viagem, meus dedos mindinhos pareciam ter desaparecido e estavaREALMENTE difícil andar sobre eles! Eis que a irmã disse: “Papai não tem o dedão do pé direito e ANDA!” Naquele instante, meio que me perdi num buraco negro no espaço-tempo e me lembrei dos cirurgiões falando que seria complicada e talvez demorada a adaptação sem o dedo.

Pois, acreditem se quiser, 10 dias após ter sido liberado para colocar o pé no chão, meu pai voltou a dirigir e deixou claro que dormiria, assim que fosse aconselhável, no quarto dele na cobertura (tendo que subir uma escada estreita em caracol)! Com a praticidade da minha irmã, eu percebi que podemos ser como os passarinhos, ou como o meu pai(E TANTOS OUTROS HUMANOS), que mais parece uma mistura da obra deFrankenstein com o Highlander!

Nesse momento, estou encerrando esse texto, no computador do trabalho, e as pernas queimam, FRENETICAMENTE! Estou apreensiva sim com o modo que irei me levantar, e atualmente, preciso pensar antes de dar cada PASSO. Mas, até o dia em que eu venha a cair (caso ocorra), ME LEVANTAREI E SAIREI ANDANDO EM DIREÇÃO À CONDUÇÃO! PORQUE, LHES PERGUNTO: QUANTAS COISAS PERDEMOS, POR MEDO DE PERDER? NOVAMENTE, VOS SUGIRO: SE FALTAREM PERNAS, VOEMOS...

quinta-feira, 21 de abril de 2016

MORTE EM VIDA...

“Um dia...Pronto!...Me acabo.

Pois seja o que tem de ser.

Morrer: Que me importa?

O diabo é deixar de viver.”

(Mario Quintana)

Outro dia após uma decepção no trabalho, um grande colega me perguntou: “Que falta você faria se não existisse?” e me indicou uma palestra do filósofo Mário Sérgio Cortella, que deixarei aqui para todos que desejarem assistir Link: (Clique aqui para assistir). Por coincidência, nessa mesma semana, li uma postagem no Facebook que dizia efusivamente: “Os médicos dizem que NÃO, mas a Esclerose Múltipla matou a minha irmã!”. Passado o incômodo de ler um comentário desses (sem argumentação ou embasamento científico), todo esse panorama me fez refletir sobre o que venho fazendo com a minha vida e, sobretudo, sobre o que estou fazendo COM, POR, PARA, ATRAVÉS e APESAR da minha Esclerose Múltipla.

E “conversando” com esses dois autores, me vem uma pergunta: “Quando é que, de fato, deixamos de viver?” Quando temos uma vida pequena, banal, fútil, inútil, superficial e MORNA. Afinal, nós humanos vivemos uma vida muito curta para que não a honremos e a deixemos se apequenar. No Brasil, temos, em média, 75 anos de vida, dos quais dormimos cerca de um terço, ou seja, pouco tempo para que tornemos nossa existência realmente importante. Destaco que ser importante não significa ser famoso. Na minha humilde opinião, embebida em Cortella, significa estar em alguém, deixar algum legado, trocar conhecimentos, incitar mudanças, consolidar alguma OBRA! Mas, como fazer isso com Esclerose Múltipla? Acredito que cada esclerosado terá muitas respostas para essa pergunta. Eu, particularmente, sigo com a vida, dia após dia, normalmente, brigando com a doença, que evidentemente, me incomoda, mas que JAMAIS me acomodará.

Vida é partilha, mas, infelizmente, a sociedade atual tem uma lógica extremamente predatória e egocêntrica, que nós esclerosados bem conhecemos. Somos vítimas dela toda vez que um amigo, familiar, chefe se afasta ou nos julga, abarrotados de preconceitos. Me lembro que no período do meu diagnóstico, que coincidiu com minha formação em Biologia (lá se vão 8 anos), o lema da minha turma foi: “Cada um por si e Darwin contra todos.” Apesar de nunca ter concordado com essa visão individualista, deveras, ela refletia o que éramos: um bando de jovens iniciando a vida profissional, contaminados por uma competitividade doentia, pensando no melhor para si próprios e para uma meia dúzia de amigos, escolhidos a dedo. É no sentido de partilhar de coração, sem preconceitos e verdadeiramente, que escrever, conversar, trocar conhecimentos e “militar” pelos direitos de todos quem têm EM me fazem sentir-me mais VIVA e FERVENTE. Vocês já pensaram o que os fazem sentir assim? Talvez, ao tentar responder essa pergunta, cada um de nós comece a dar sentido à vida, que, além de curta, é ÚNICA.

Pensar numa vida que é curta, única e imprevisível, na qual as únicas certezas são que existe um início e um final, é tema bastante complicado para a maioria dos humanos, visto que nos obriga a aceitar a nossa condição de MORTAIS. Pensar a mesma coisa com uma doença crônica, neuroinflamatória, incurável e, em alguns casos, bastante progressiva, é tarefa ainda mais complexa. Ademais, se pararmos para refletir friamente, o ser humano é o único ser vivo que tem consciência de que irá morrer, e tal consciência traz um misto de sentimentos, além da responsabilidade de pensar em “qual é a sua/nossa obra? O que iremos deixar?” Dizem por aí que se deve viver um dia de cada vez. Costumo dizer que, no caso da EM, vivo um segundo de cada vez, tentando manter a coragem e disposição. Vou construindo minha vida momento a momento, tentando não pensar no dia em que ela irá acabar, ou, quando um novo surto ou sequela, ou sintoma virão. Tento me manter focada numa frase de que gosto muito, de David Herbert Lawrence, presente num filme que mostra uma história bárbara de superação e luta contra discriminações: "Eu nunca vi algo selvagem ter pena de si mesmo, um pássaro cairá morto de um galho sem jamais ter sentido pena de si mesmo”.

Independente de odiarmos, negarmos ou aceitarmos a condição de ter Esclerose Múltipla, tal existência permanecerá presente em nossas vidas (até que, quem sabe, se ache a cura). Então, se posso escolher entre sorrir para mim mesma e “sambar na cara da doença”, ou deixar que ela me deprima, me domine e cresça; certamente, fico com a primeira opção. Alguns podem se perguntar: se a morte é inevitável (com ou sem EM), por que enveredar numa luta insana contra essa doença? Por que você apenas não se diverte com a vida? Sei que um dia eu morrerei e todos vocês também (talvez de EM, talvez de velhice ou de qualquer outra coisa). Lembro que um dia entrei no consultório do meu neurologista desesperada, em surto e sem sentir as pernas, e ele disse com a maior calma do mundo: “Liane, sinto muito, você está morrendo. Todos nós estamos, porque viver mata.” Mas, cá entre nós, eu NÃO QUERO IR EMBORA!! E então?

Venho aprendendo que existe apenas um único jeito de ficar neste mundo: “e é fazendo falta! Pois morrer é ser esquecido!” Enquanto conseguirmos ser lembrados pela vida que vivemos, por menores que sejam as lembranças, estaremos totalmente vivos. Enquanto formos recordados (trazidos de novo ao coração), significa que, de alguma forma, alguém se importa (traz para dentro) conosco. NÓS FICAMOS EM NOSSAS OBRAS! AFINAL, NÃO PODEMOS SER IMORTAIS, MAS PODEMOS SER ETERNOS! Mas, como ser assim com EM? EU DIRIA QUE SENDO, E PONTO FINAL! Como se não houvesse doença! Já dizia Albert Schweitzer que “A tragédia do homem é o que morre dentro dele enquanto ele ainda está vivo." E nesse ponto, ressalto: quanta gente leva uma vida rasa e não tem a metade das limitações que nós, esclerosados, temos? Quantas pessoas fazem o mínimo e são “mais ou menos”, por opção? Essas pessoas morrem em VIDA, apodrecendo pela cabeça e, por vezes, nem pensam sobre a inexistência ou pequenez de sua obra! Elas vivem a vida no automático, “envelhecem” e acham que estão prontas e que não precisam aprender mais nada. Por isso, lhes convido a fazer o que forem capazes cotidianamente, e refletirem sobre quais são as suas obras?

Se é capaz de trabalhar? Trabalhe!
Se é capaz de cozinhar marmitas para mães de baixa renda? Cozinhe!
Se é capaz de dar conselhos sobre EM e sobre a vida ? Dê!
Se é capaz de se expressar com palavras? Fale ou escreva!
Se é capaz de sorrir diante dos problemas e da vida? Sorria!
Se é capaz de ouvir os problemas dos outros no ônibus e na vida? Ouça!
Se é capaz de ser bom filho, pai, cônjuge, amigo? Seja!
Se é capaz de cuidar do meio ambiente? Cuide!
Se é capaz de andar? Ande!
Se é capaz de dançar? Dance!
Se é capaz de pintar, fazer esculturas, cantar? Faça arte!
Se é capaz de cuidar de animais? Adote quantos puder!
Se é capaz de doar fortunas? Doe, pois é preciso!
Se é capaz de doar seu tempo em grandes iniciativas? Doe, pois também é essencial!

Mas, se você APENAS se acha capaz de ser você mesmo, ser individual, doente e recluso, reflita!

NADA é apenas algo em si! Todo real é relacional, já dizia Bourdier! Além disso, cada atitude de um ser é como uma jogada no jogo da vida e do mundo (já falava Norbert Elias). Cada passo que se dá pode gerar infinitas possibilidades, não só para o dono da jogada, como para todos e TUDO que o cercam! Tenho tentado, dia após dia, me imaginar e viver partilhando conhecimento e energia com o mundo.

“O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia” (Guimarães Rosa), sendo a única “coisa que se leva da vida a vida que se leva” (Barão de Itararé). O tempo que se tem é o agora. Então, que aproveitemos as oportunidades para que no futuro não haja arrependimentos de não termos “podido, quando devíamos, porque não quisemos quando pudemos” (François Rabelais). E, se ninguém pode voltar atrás e fazer um novo começo, QUALQUER UM pode recomeçar e fazer um novo fim (Chico Xavier), almejando que a viagem seja “longa” e plena e o “desembarque” seja rápido e tranquilo como um sopro! (saudação Árabe)

E, por fim, aqui vão as lições mais importantes que venho aprendendo com/na/da/para/pela vida: Se após refletir, você ainda se achar APENAS capaz de ser você mesmo, SEJA VOCÊ!

Mas... 1) No melhor estilo americano, busque ser o melhor que puder! Não o melhor do mundo, mas, o seu melhor (I WILL DO MY BEST!), enquanto luta por condições melhores, paralelamente; 2) Tenha uma vida boa e plena, para que a morte seja igual! Ame a vida, as pessoas e o mundo, pois quem ama cuida e não desiste! Divida, se doe, ore, trabalhe e sorria. Pois na hora de se despedir da vida, são essas coisas que nos fazem falta! E 3) Por mais difícil que seja, debata, discorde, discuta, mas não resmungue, pois enquanto estamos amaldiçoando o escuro, poderíamos acender uma vela.

DIGO ISSO PARA TODOS, PARA OS QUE TÊM ESCLEROSE MÚLTIPLA E, ESPECIALMENTE, PARA MIM! SE AS PERNAS NOS FALTAREM, VOEMOS...


ORA e LABORA...

“Seu trabalho vai ocupar uma grande parte da sua vida. A única maneira de estar verdadeiramente satisfeito é fazendo aquilo que você acredita ser um ótimo trabalho. E o único jeito de fazer um ótimo trabalho é fazendo algo que você ama.”


(Steve Jobs)

Muitas vezes me questionam por que eu ainda trabalho, mesmo tendo Esclerose Múltipla e a minha resposta é sempre a mesma: “Porque trabalhando eu me sinto o mais normal e útil possível”. Comecei a trabalhar, oficialmente, em 2010 e até 2013, poucos no ambiente de trabalho sabiam que eu era esclerosada. Antes disso, porém, passei uns 2 anos dando aulas particulares, preferencialmente, de matemática, química e biologia. Eu era a típica “professora muito maluquinha”! De fato, de 2008 a 2013, durante os 6 primeiros anos de esclerose, nem mesmo todos os meus amigos sabiam da doença.

Mas, como lidar com todos os sintomas diários no decorrer da labuta? No meu caso, lido como se não estivesse num ambiente de trabalho. No geral, ignoro-os, mas quando não é possível, deixo claro tudo o que sinto para os colegas que estão em volta. Certamente, ser servidora pública concursada e trabalhar, predominantemente, sentada, facilita tudo. Se assim não o fosse, possivelmente, já estaria aposentada e é por isso que não julgo meus colegas esclerosados e do lar. Meu horário cotidiano é de 9-18h, sendo que costumo trabalhar de 12-18/19h ou 20h. Além disso, às vezes, trabalho de casa. Tento compensar todas as horas não trabalhadas com velocidade de raciocínio, qualidade e comprometimento. Vivo trabalhando pela internet em fins de semana, feriados, férias, pelo celular (até dentro do ônibus) e/ou tarde da noite em casa. Já já, assim que finalizar esse texto, vou escrever um projeto. Não faço isso para ser melhor do que ninguém e me sentir heroína, mas, para me sentir NORMAL e, sobretudo, por acreditar na força do trabalho, independente da natureza dele. Por sorte, no meu emprego posso criar e ser livre. Amo tanto o que faço e tenho chefes tão pacientes que parece até que trabalho para mim mesma. Logicamente, nem sempre são flores e sei que já deixei de assumir cargos (o que significa dinheiro) por ser esclerosada, o que me deixa triste além de beeemmmm irritada, afinal, NUNCA deixei de assumir responsabilidades por ser doente. Já fiz tanta coisa que vocês cairiam no riso, desde reunião sozinha com prefeita de cidade pequena (sendo eu, gerente substituta e de graça) até servir café! Volta e meia viajo pelos lugares mais bonitos do estado, aqueles onde os ricos passam fim de semana/feriados e férias! Além da minha missão com o meio ambiente e com o planeta, adoro ser útil, ainda que menos remunerada do que gostaria e quase nunca valorizada! o principal: TUDO ISSO JÁ BEMMM ESCLEROSADA!! Há 8 anos, desde o diagnóstico, tenho uma medula que parece mais um queijo suiço, de tantos buracos na mielina!

Ah Liane, mas você deve morar numa cidade agradável... Moro na capital do RJ e trabalho na Praça Mauá, bem ali do “ladinho” da “#cidadeolimpica”. É absurdamente quente, bem poluída, quase tão engarrafada quanto São Paulo, perigosa, pra quem não conhece. Mas, MARAVILHOSA para quem visita! Resumindo: É uma dureza sair da cama e ir trabalhar de ônibus todos os dias, mesmo sem Esclerose! Imaginem sendo NOTURNA DESDE SEMPRE, tipo um lula molusco pela manhã, amando dormir, e ESCLEROSADA? Mas, “eu vou que vou” do melhor jeito que consigo! Ultimamente, tenho pego tantos táxis, que não me admira que meu salário não esteja sendo suficiente, e que eu ande dependendo de “irmãtrocínio”. Mas, ainda assim, eu vou! Vou porque trabalhar me anima, preenche meu dia, me dá motivos para seguir e, a longo prazo, aumenta meus triênios.

Mas, quando você falta, se sente mal? Então, me sinto desconfortável, sim. Mas, muito menos do que se tivesse que sair da minha casa para passar mal, não produzir nada e ainda chegar no trabalho, apenas para desequilibrar o ambiente dos meus colegas. Dia após dia, venho aprendendo a me respeitar cada vez mais.

Mas, eu não consigo mesmo trabalhar fora! Você quer que eu me sinta mal com seu texto, né?Não, NÃO, DEFINITIVAMENTE NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOO! Quem disse que só fora se trabalha?? Conheço esclerosados que ralam tanto em casa que me deixam cansada só de ler!

Mas, em casa é diferente! Eu discordo! Trabalho é trabalho e, se é para o bem, dignifica e torna a vida produtiva. Afinal, como disse no meu último texto: “A vida é muito curta para se APEQUENAR.”

Mas, em casa eu não sou remunerado? E daí? Eu pergunto! Hoje digo que tenho ao menos quatro trabalhos! O primeiro é aquele que paga meu salário! O segundo é escrever para ABCEM e tentar ajudar em tudo o que posso! A maioria não sabe, mas me convidei para entrar na ABCEM, pois queria que as palavras alcançassem mais gente do que no meu blog pessoal! Agora já sabem como e porque essa menina do RJ surgiu na associação de Esclerose Múltipla do ABC paulista. O terceiro é moderar páginas no facebook para ajudar esclerosados como eu e o quarto é escrever em diversos grupos, tentando esclarecer o máximo de dúvidas que eu puder sobre a doença, seu diagnóstico, sintomas, tratamentos, tipos etc.

Além disso, tento escrever meu próprio blog, milito em prol de questões políticas que me são caras e, muito raramente, ajudo minha irmã em campanhas solidárias, totalmente voluntárias [ando dormindo demais (umas 10h por noite), não sei bem o porquê, e portanto, está faltando tempo, infelizmente]. Chamo tudo isso de trabalho, não pelo quanto sou (nada) famosa nem paga, mas pelo quanto me comprometo com essas temáticas. Cada um dos elogios e agradecimentos me faz tão feliz que preenchem lacunas antes imensas. Hoje, não faço mais terapia e ando me sentindo bem completa, resolvida e mais calma, APENAS escrevendo. Cada vez mais cheia de vontade e de ideias, além de alguns projetos e sonhos. Tenho entendido que não é preciso abrir um negócio para ser empreendedor, sendo possível empreender com a própria vida todos os dias, mantendo a positivi.dade e a vontade de viver!